quarta-feira, 4 de julho de 2012

Por onde anda?


 Vários professores passaram pelo projeto Pré-Vestibular Comunitário e deixam saudades a seus alunos e colegas de profissão. Um destes profissionais que ministrou com afinco suas aulas foi Felipe Santos, professor de Filosofia. Na entrevista ping-pong, ele relatou um pouco de sua vida.
 





Nome completo: Felipe Santos Almeida.

Idade: 26 anos.



Qual o período que você ficou no Programa Conexões de Saberes?

Fiquei no Conexões de Julho de 2008 a Dezembro de 2011.

Qual a sua formação acadêmica?

Licenciatura em Filosofia pela UFAL.
Concluindo especialização em Filosofia Contemporânea, com ênfase em epistemologia, pela UFAL.

Qual o concurso que você foi aprovado? Qual centro (Local)?

Professor de Filosofia do Nível Básico, Técnico e Tecnológico no Instituto Federal de Alagoas (IFAL). Estou lotado no Campus Penedo.

Qual a importância do Programa Conexões de Saberes em sua vida?

Inicialmente o Conexões me apareceu como um suporte financeiro. Na época, em 2008, eu acabara de ficar desempregado. Uma professora da UFAL, sabendo da minha situação, me convidou para dar aulas no pré-vestibular da Chã da Jaqueira, mas apenas como voluntário, recebendo apenas as passagens de ônibus e sem nenhuma perspectiva de bolsa. Na verdade, eu nem sabia da existência do Programa. Foi quando os meus alunos da Jaqueira me informaram da seleção para bolsista de Filosofia, e que tinha duas vagas para cinco candidatos. E, claro, uma delas foi minha (risos). Já como bolsista, e agora parcialmente resolvido meu problema financeiro, tive a oportunidade de frequentar espaços e cruzar temáticas que não me foram possíveis durante os quatro anos de minha graduação, pude viajar com um grupo encantador de pessoas maravilhosas, participar de encontros, apresentar trabalhos, participar de debates, enfim, vivenciar tudo aquilo que é indispensável para a formação de qualquer estudante. Posso dizer que pude sentir um pouco daquela velha proposta que bem conhecemos, qual seja, a permanência na Universidade com qualidade. O Conexões de Saberes mudou minha vida, em tudo, me "conectando" ainda mais aos diversos "saberes" do mundo!

Em sua opinião, qual a importância do curso Pré-Vestibular Comunitário para a sociedade alagoana?

O meu povo é um povo historicamente sofrido e massacrado pelas elites que aqui dominam, mas nem por isso minha gente fica de braços cruzados. Somos um povo que de fato arregaçamos nossas mangas e enfrentamos nossos problemas com a luta diária pela sobrevivência e pela dignidade. Sem dúvidas estamos longe de uma transformação social profunda aqui em Alagoas, ao tope de uma revolução; ainda precisamos amadurecer muito como agentes políticos que somos de nossa própria história. Entretanto, são ações e resultados como as do Programa Conexões de Saberes que comprovam o ser aguerrido expresso nas minhas palavras. A evidência, nesse sentido, não é só quantitativa, quando nos reportamos para o número enorme de alunos aprovados no vestibular da UFAL - bem como de outras universidade e faculdades - pelo nosso Pré-Vestibular Comunitário, mas também qualitativa. Ora, uma simples pesquisa vai mostrar que muitos de nossos ex-companheiros de trabalho no pré-vestibular estão hoje em uma situação bem encaminhada na vida profissional, muitos com publicações em livros e artigos científicos, outros com especialização, mestrado e doutorado. E quantos de nossos alunos no Conexões não tinham dificuldades de ordens diversas para frequentar uma sala de aula e, assim, se preparar para ingressar na universidade pública? Lembremos, dentre outros, de dois casos históricos em nosso cursinho, em que dois alunos lograram êxito de tornarem-se estudantes da UFAL: o índio Wassu Cocal Evandro José de Lima, que participou do Pré-Vestibular Indígena, foi aprovado no curso de Geografia Licenciatura; e a Djânea, uma ex-catadora de lixo que fez o pré-vestibular comunitário e foi aprovada no curso de Ciência da Computação. São apenas alguns exemplos do potencial do Pré-Vestibular Comunitário Conexões de Saberes, potencial que se assoma com a garra - e por que não a guerra pela sobrevivência? - e a força dos alagoanos, mas principalmente com a carência de dias melhores para nossa terra tão privilegiada pela natureza, mas tão má conduzida por alguns homens!

Qual o legado que o Programa deixa para a sua vida? Você levará os ensinamentos para a sua vida profissional, como?

Aprendi a ser profissional no Conexões, aprimorei o potencial que havia descoberto ainda na infância, ou seja, a arte de ensinar. Mas ensinar pressupõe aprender antes, e sei mais aprender do que ensinar. Ora, tanto mais ensinamos quanto mais aprendemos! No Conexões aprendi que o saber não possui dono, ele apenas está à espera de quem o queira aprender e ensinar. Somos, de fato, instrumentos do saber, pontos de contato, de encontros nos quais nos conectamos a outros pontos. O que eu sei não é meu, nem de ninguém. Compartilhar é a regra, ajudar é um princípio. Somos um canal, mas um canal que também produz e leva adiante. Só me tornei profissional quando aprendi isso, e mais, quando passei a praticá-lo, e foi no Conexões, este grande laboratório, em que fiz meus melhores experimentos didáticos, e obtive os melhores resultados. Deixe-me contar um pequeno segredo: desde que fui aluno do antigo Centro Federal de Educação Tecnológica de Alagoas (CEFET-AL), hoje Instituto Federal de Alagoas (IFAL), alimentei o desejo ser professor desta escola. Um dia eu falei para minha professora de Fundamentos Socio-filosóficos (FUSF), a professora Dinah, da decisão que eu tomei de prestar o vestibular para Filosofia na UFAL. Ao que ela respondeu: "Faça, e um dia seremos colegas de trabalho!". Bem, hoje a professora está aposentada, não somos colegas de trabalho, porém trabalho na mesma instituição que ela. Na prova do concurso obtive o 2º lugar, dos 45 candidatos que fizeram a prova. Mas tem um detalhe: a segunda fase da prova constitui-se de uma aula didática, dentro dos padrões formais. Alcancei nessa fase o 1º lugar, com uma nota 90, de 0 a 100. Fui aprovado porque dei uma boa aula didática, e onde eu aprendi isso? No laboratório-conexões, naturalmente! Não quero me engrandecer, pois isso é uma grande besteira. É bom lembrar que me esforcei muito para isso, não foi nada da noite para o dia, mas leve-se em consideração que fiz um treinamento pesado no Conexões, e tudo isso fez meu esforço valer a pena.  Realizei um grande sonho! E agora, que já realizei este sonho? Levo para essa escola o aprendizado do Conexões, me esforço todos os dias para me tornar esse ponto de encontro de saberes, esse verdadeiro motor que gera e transmite conhecimento na sala de aula, na sala dos professores, nos corredores, na hora do intervalo, na internet, enfim, na escola. Sou um profissional que permite encontros, e que impulsiona adiante o saber e a novidade de novos encontros.

Qual a sua origem familiar?

Uma vez, na Ilha de São Pedro, em Porto da Folha-Se, nas terras dos índios-irmãos Xokó, de manhã logo cedo, ainda deitado após despertar de uma noite de sonhos e discussões sobre Filosofia, Ciência e Astronomia, meu professor, o prof. José Nascimento de França, também ao despertar na cama ao lado, me perguntou: "Felipe, qual a profissão de seus pais?". E disse-lhe: "Minha mãe é atendente de um consultório médico e instrumentadora cirúrgica em alguns momentos, e meu pai é caminhoneiro por profissão, embora já esteja aposentado". Daí o professor Nascimento concluiu: "Então, Felipe, você é filho de proletários, de trabalhadores". E continuou: "Para quem você irá trabalhar com sua ciência e sua Filosofia?". Então lhe respondi, com um tom reflexivo: "Infelizmente, para a classe dominante". Desse dia em diante tomei plena ciência do meu papel social como professor, e como indivíduo oriundo da classe proletária. Desse dia em diante entendi que deveria tomar uma posição segura do que fazer com o meu trabalho, com meus esforços sociais, políticos, intelectuais, e decidi que não queria trabalhar para a classe dominante, mas lutar pela democratização, pelo comunismo, pela igualdade de direito entre os homens, e pelo respeito às diferenças. Sou sim, de origem de classe proletária, e minha posição de classe é pela paz e pelo respeito mútuo.

Quais os seus planos para o futuro?

Meu plano inicial é viver até os cem anos, porém se não for possível espero realizar, até onde for vivível, alguns desejos que ainda permanecem no mundo dos sonhos. Por exemplo, fazer o mestrado e o doutorado. Penso que todo profissional deve buscar seu aprimoramento, pois são muitos os benefícios materiais e espirituais por ele trazidos. Pretendo realizar projetos que envolvam a Filosofia voltada para as comunidades, mas no âmbito do tripé ensino, pesquisa e extensão. Bem, são muitas as realizações, o futuro é o que menos me preocupa, embora eu perca muitas vezes noites de sono por ele. No mais, desejo cuidar bem dos meus filhos (já tem uma filha, a Júlia, em seu sétimo mês de gestação), da minha esposa, da minha família que tanto me apoio em todos os momentos da minha vida. Eles merecem o melhor lugar do mundo.



4 comentários:

  1. muito legal essa entrevista com Felipe, afirmo que até me encorajou mais um pouco a também correr atrás daquilo que eu quero. então é isso mesmo!!

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  2. Parabéns Felipe trabalhei com você e não me surpreendi, pois sabia que você como todos aqueles que passaram ou que ainda estão no Programa Conexões de Saberes são vitoriosos, pois aprendemos o sentido do tripé na Educação: o Ensino, a Pesquisa e a Extensão.
    Mais uma vez parabéns.
    Rejane

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  3. Esse prof. vai deixar saudades, sua dedicação e interesse para que os alunos aprendam não só saber fazer, mas também saber como fazer, me fez ir além do que esperava nos estudos, desde já dou os meus parabéns para este que entre muitos se destacou em nossas vidas.

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  4. Sem palavras! Sensacional [Felipe,sou sua fã!]

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